Direção: Joe Russo, Anthony Russo. Roteiro: Christopher Markus, Stephen McFeely. Montagem: Jeffrey Ford, Matthew Schmidt. Direção de Fotografia: Trent Opaloch. Design de Produção: Charles Wood. Música: Alan Silvestri. Produção: Victoria Alonso, Jon Favreau, Kevin Feige.
O que constitui a natureza de um filme de super-herói? E quais os elementos que o dotam de energia mesmo após as décadas que comumente seguem os lançamentos na maior parte dessas obras? Para os filmes do Universo Cinematográfico Marvel (UCM), entretanto, as respostas assumem diferentes nuances. Todas elas convergiram e levaram ao todo que Vingadores: Guerra Infinita (2018) representou e certamente seguirá representando ao longo dos próximos anos.
19º filme produzido pela Marvel Studios desde Homem de Ferro (2008), o longa narra a batalha dos Vingadores e seus aliados numa tentativa de deter Thanos (Josh Brolin), um poderoso Tintan que se dispõe a reunir as seis Jóias do Infinito* existentes a fim de reduzir a vida ao redor do universo pela metade. Apesar do tom genérico contido nas sinopses de filmes do subgênero, Guerra Infinita afirma sua consistência em função da irrefutabilidade dos seus elementos de forma e conceito.
E o equilíbrio entre os tons de todos os filmes que o antecederam é talvez a maior marca desse trabalho. Estamos diante de um longa de aventura da Marvel com todas as suas conhecidas fórmulas: ação, comédia, drama e romance operando numa mesma escala, mas fluindo por meio de variações tonais muito precisas. Há uma seriedade e tensão que convergem positivamente com elementos como a comicidade e a aventura.
Quando os créditos iniciais de Guerra Infinita surgem na tela é a trilha sonora da canção Travel Delays, composta por Alan Silvestri, que nos anuncia o peso e a temeridade que se aproxima. Estamos diante de Thanos ou aquele que, sem dúvidas, é o antagonista mais complexo apresentado em uma obra do UCM. E aí, elementos como a morte, a loucura e o esforço em torno de um ideal formam a gama de significados em torno dessa figura.
Poderíamos fazer uma crítica apenas como os traços que fazem essa personagem tão brilhante, narratologicamente falando. Mas seguir adiante é necessário em função dos outros pontos de destaque do filme. O que nos leva direto para o que entendemos como seus "momentos heroicos". Esse é um termo fulcral para o longa porque redefine um importante aspecto da figura desses heróis: eles serem elementos que nos inspiram coragem e força.
Aqui eles surgem em dois momentos mais precisamente. Um primeiro ligado à sequência onde uma das equipes de heróis aparece em apoio a um outro grupo que estaria sob ataque. E outro, muito semelhante onde um outro núcleo de heróis volta para prestar reforço durante uma batalha final. Essas são construções chaves quando lidamos com filmes de super-heróis. Eles podem ser mais que produções realizadas em escala industrial. Podem nos apresentar aventuras intergaláticas sem que nos desconectemos das questões que cercam nosso dia a dia.
Mas os demais trabalhos da Marvel não haviam o feito até então? Sim, o fizeram. Mas se voltarmos a Vingadores: Era de Ultron (2015), perceberemos o quanto o longa é revestido por conceitos bastante genéricos. Os personagens não possuem peso dramático, assim como o restante do filme em seu enredo, fotografia e trilha sonora. E certamente foram em cima desses pontos que Joe Russo e Anthony Russo desenvolveram esse terceiro filme solo dos Vingadores.
Um exemplo disso é percebermos o quanto Guerra Infinita é um filme para ser visto também com os ouvidos. Porque a música de Alan Silvestri é mais que pano de fundo. Ela dita em primeiro plano cada sequência a que vemos, algo muito semelhante a Star Wars (1977). Quando a equipe do Capitão América (Chris Evans) chega à Escócia, por exemplo, ouvimos e vemos a trilha sonora complementando as imagens na tela e ambas guiam nossa percepção e reação ao longo da cena.
A própria montagem do longa e sua natureza elíptica deram a ele uma leveza irretocável. Assim como as histórias em quadrinhos que compõem as Sagas “The Infinity Gauntlet” (1991) de Jim Starlin e “Infinito” (2012) de Jonathan Rickman, Guerra Infinita otimiza sua duração de 2 horas e 29 minutos por meio de precisos saltos temporais. Todos os eventos do filme nos parecem ocorrer num intervalo de 48 horas corridas considerando o espaço-tempo daquela narrativa. É dessa agilidade que a leveza do filme deriva. O que não vemos em obras como Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge (2013), por exemplo.
E se os irmão Russo decidiram filmar o longa com câmeras IMAX** é porque entendem que o componente estético se associa diretamente à ideia conceitual da obra. É claro que não estamos diante de um épico como o gênero se faz conhecer, ou mesmo o imaginário do fã mais empolgado e sem muito repertório da gramática do cinema tende a acreditar. Mas dos três filmes sobre os Vingadores realizados até o momento, Guerra Infinita é sem dúvidas o mais esteticamente impecável. De fato, o filme é lindo!
Cada plano contido nele conta uma parte da estória, o que curiosamente o aproxima muito do dispositivo dos quadrinhos, já que, aqui, a economia de cada quadro é definitivo para o resultado final da obra como um todo. Sua paleta de cores opera igualmente nos dizendo o que vemos. Elas contêm significância e ajuda a nos situar nos diferentes cenários montados. Para as cenas na Terra, cores mais naturalistas e frias. Para sequências no espaço, como em Nidavelir, cores mais escuras com tons de azul, preto e cinza, e assim por diante. É a gramática cinematográfica a serviço da boa cinematografia, que nos ensina enquanto a experienciamos como espectadores.
Vingadores Guerra Infinita é mais do que um projeto rentável da Marvel Studios. É uma obra que nos colocou um misto de percepções e dúvidas. É um ponto de virada, definitivamente. O gênero de super-heróis pode ser algo maior, mais complexo e que se permite repensar. A jornada pode ser do vilão, por mais desconfortável que isso nos soe.
Do mesmo modo, nossos heróis podem falhar também. A maturidade do todo que esses filmes o são passa por isso também. Por isso que este é um filme único não apenas na linha do tempo do estúdio, mas igualmente junto do nosso imaginário, mesmo que sejamos espectadores de 30 ou 6 anos de idade.
* Originárias das Histórias em Quadrinhos da Marvel Comics e adaptadas no Universo Cinematográfico Marvel, as Joias do Infinito são seis singularidades cósmicas imensamente poderosas e que representam os seguintes aspectos do universo: Poder, Tempo, Mente, Espaço, Realidade e Alma.
** O IMAX é um sistema de câmeras de alta resolução, formatos de filmes e projetores de filmes. Os primeiros padrões de projeção de cinema IMAX foram desenvolvidos ainda em 1960 no Canadá por Graeme Ferguson, Roman Kroitor, Robert Kerr e William C. Shaw.
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