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Vidro: A dúbia potência contida em Shayamalan


Direção: M. Night Shyamalan. Roteiro: M. Night Shyamalan. Produção: Gary Barber Fotografia: Mike Gioulakis. Montagem: Luke Ciarrocchi, Blu Murray. Música: West Dylan Thordson




Vidro (2019), escrito e dirigido pelo realizador indiano M. Night Shyamalan, é um filme que nos incita múltiplas questões. Se ele pode, ou poderá, ser visto como uma das obras referenciais deste século, é uma questão de difícil resposta, neste momento. Seus trabalhos incorporam uma interessantíssima relação com a temporalidade e o exercício de recepção espectatorial e crítica. E nessa trilha de indefinições interpretativas é que seu 13º longa-metragem nos chega.

A trama se desenvolve a partir da conclusão de Fragmentado (2017) e reapresenta David Dunn (Bruce Willis), um segurança que acredita ter força sobre humana; Kevin (James McAvoy) um homem que possui um distúrbio que lhe confere 24 personagens; e Elijah Prince (Samuel L. Jackson), um maniqueísta que mantém segredos acerca de ambos esses homens. Presos no mesmo centro psiquiátrico, eles terão de lidar com as consequências dos seus poderes enquanto se mantém à sombra da misteriosa da Dr. Ellie Staple (Sarah Paulson).

Um dos pontos de maior força em Vidro é o seu senso de unidade. E de como os temas levantados nos antecessores Corpo Fechado (2000) e Fragmentado (2017) foram religados aqui como uma estória de conclusão. Basicamente, tecidos por meio de temas como a família, os traumas, o sentido de crença, o universo da cultura pop e dos mitos de super-heróis.

Há claramente uma intencionalidade de Shyamalan em trabalhar sob essa linha temática, ora conscientemente em favor da sua obra, ora acidentalmente contra ela. Mas ainda sobre aquilo o que a eleva, ressaltamos esse trato no desfecho a partir do zelo que a autoria preserva. E na escala criativa deste diretor, isso sedimenta-se no uso que ele faz do ponto de virada, ou nos incidentes que mudam decisivamente o curso da ação dramática no filme.

Assim como em A Vila (2004), por exemplo, há em Vidro essa informação que redefine parte do sentido da estória que acompanhamos. Mas aqui ela perde impacto muito em função de uma carência no desenvolvimento das ações dramáticas, seja por uma questão de enredo ou de dinâmicas entre suas personagens, mesmo.

Apontar essa ambiguidade é importante porque, apesar do esforço perceptível da direção em solidificar essa perspectiva unificada, ela acaba se estabelecendo nessa chave dúbia do que é potência e insuficiência. E analiticamente falando, o conjunto desse “novo Shyamalan” é bastante fragilizado. O desejo do filme em se autoafirmar junto ao público, ou ao menos àquela parcela mais passiva – desse espectador que ri na sala de cinema dos trejeitos e falas de David – o leva a uma espiral de um cinema mais preocupado em “recompensar” esse espectador por meio de fan services e humor gratuito.

Tal sentido de esvaziamento opera contra o filme, definitivamente. Há o eixo mitológico que as Histórias em Quadrinho trazem consigo, mas toda essa força se esvai em blocos dramáticos muito truncados, como se as soluções criativas e seu desenvolvimento estivessem, na verdade, trancados dentro desse espaço fechado junto com Kevin, David e Elijah.

E quando eles literalmente partem para o espaço aberto, a escolha do autor é a de reencenar ações já apresentadas no primeiro ato (uma luta entre David e Kevin), ou de aplicar uma brusca quebra de perspectiva de uma personagem até então importante para a narrativa, como a Dra. Ellie, mas que na verdade se revela unidimensional em contraste aos dois primeiros atos onde ela supostamente apresentava-se como a figura de múltiplas camadas. De fato, uma personagem mal aproveitada e mal desenvolvida.

Vidro tem seus méritos técnicos, quando analisamos a estilização da fotografia de Mike Gioulakis e do design de produção de Chris Trujillo. Mas o descompasso de outros importantes pontos como o desenvolvimento do roteiro e a falta de fluidez em sua montagem, assinada por Luke Ciarrocchi e Blu Murray, o tornam um filme muito irregular.

Ele detém nossa atenção pela afeição que temos a essas figuras extra(ordinárias), mas o sentimento de decepção se torna mais evidente em contraste à frustração, que tem sido um um vigoroso catalisador, sobretudo considerando a experiência do cinema de horror/ficção contemporâneos.


Mas essa parece ter sido uma reflexão que Shayamalan tenha negligenciado quando consideramos Vidro enquanto um trabalho isolado. Poderia ter sido uma distinta experiência cinematográfica, com a reconfiguração de alguns códigos do cinema de gênero, por exemplo. Infelizmente não o foi, o que coloca Corpo Fechado (2000) como a melhor referência quando consideramos o conjunto desta trilogia.

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