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Pajeú: da reconstituição do desaparecimento

Foto do escritor: danielsa510danielsa510

Direção: Pedro Diógenes. Roteiro: Pedro Diógenes. Produção: Caroline Louise, Amanda Pontes. Montagem: Guto Parente, Victor Costa Lopes. Fotografia: Victor de Melo. Direção de Arte: Themis Memória, Filipe Arara, Natalia Parente. Som: Lucas Coelho de Carvalho. Música: Vitor Colares


"Serginho, você tem medo de desaparecer? De ser esquecido"? Essa pergunta na metade do filme marca um curioso e instigante tensionamento que projeta a obra para um outro lugar que até então só parecia ter sido ensaiado nas deambulaçoes da protagonista.


Ela deixa de estar nesse lugar do meio termo de uma dramaturgia vela ente a ficcionalidade e o documental e se assume nesse entre - lugar mas agora de forma definida.


Ela interpela o seu acompanhante, a sua frente e indossa a linha do seu raciocínio também fazendo uma revelação àquele que anteriormente parecia ser o alvo das perguntas: "Também me sinto assim, em fragmentos, em cacos. Uma mudança entre memória e esquecimento o tempo todo".


Ao que Serginho retoma: "Mas n tenho medo de ser esquecido não. Eu tenho medo de que se desapareça o poço da draga", pontua Serginho, projetando o filme mais a frente. Um corte e a palavra - chave nos lança e conecta a uma outra banda da cidade de Fortaleza. A palavra e a imagem geram a luz que movem o longa adiante.


A ideia da pergunta em si, da interpelação pode até soar meio abrupta, intempestiva, mas no fundo não é. Quando Maristela questiona os jovens da praia sobre o medo do esquecimento da própria pessoa deles o efeito não é do recuo entre quem faz a interrogação e aquele que tem de responder a respeito.


A sobreposição de imagens como uma fantasmagoria da narrativa docuficcional

É nesse instante que o filme ganha uma camada a mais pela corrente da empatia que se estabelece entre aquele que interroga, aquele que responde e aquele que testemunha a tudo isso, nós, os espectadores. Existe também um jogo muito interessante em relação à própria memória que o filme manufatura a partir da especificidade desses relatos.


Os dois jovens que conversam sobre a importância da preservação do meio ambiente e do ecossistema da praia, Luis Guilherme e George Duarte, são exemplo disso. Quem eles serão daqui há meio século diante do registro do filme em si?


Eles se reconhecerão diante das imagens ali captadas? Tem um tom de ingenuidade em parte do discurso ali empregado, mas há um senso de consciência coletiva que se faz muito singular pela sua naturalidade.


A expressão dos jovens até chega a dizer muito do próprio gesto de onde o filme parte e se conclui em si. Dessa noção de obra em colagem onde a obra ficcional cede espaço para uma narrativa ancorada na realidade. No corpo a corpo com esse outro desconhecido, Pedro Diógenes não faz um gesto aleatório por possivelmente não saber aonde está indo.


Parece injusto colocar o trabalho nesses termos quando nos abrimos a olhar os detalhes por trás de certas decisões tomadas pelo realizador. Essa busca de respostas que as intervenções na praia sugerem não é um acaso, ou um acidente, é Jean Rouch. E o que esse cinema nos revela é que a curiosidade pelo o que está na caixa de opacidade do outro talvez importe mais que tudo.


Porque é exatamente nesse exercício de troca que a obra se projeta para além da sua vertente ficcional. Ela não quer moralizar nada a respeito. O flerte até ocorre, mas o gesto do contato com esses outros é tão natural que a viagem desagua nessa consideração final sobre a história do rio. E assim como ele, Maristela se dissolve, se torna uma bruma que transita na linha do dia.

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