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A cidade é uma só?: o cinema no lugar da dialética

Atualizado: 18 de jun. de 2021


Direção: Adirley Queirós. Roteiro: Adirley Queirós,Thiago Mendonça Produção: André Carvalheira, Adirley Queirós. Direção de Arte: Denise Vieira. Som: Fracisco Craesmeyer.


Esse é, sem dúvidas, o melhor e mais importante filme da última década (2010 - 2019) do cinema brasileiro. O universo dessa Brasília contemporânea colide diretamente com a rememoração desse passado não tão distante e cujas marcas ressoam diretamente na realidade desse Brasil apartado.


Ele reflete esse estado de uma cinematografia que estava em iminente transição no paradigmático ano de 2011 para o nosso cinema. Reflexão essa que vai ao encontro do próprio pensamento evocado por César Migliorin e seu pensamento alinhado à logica da pós-industrialização.


Nessa percepção, o filme nacional não teme mais a adoção e retorno à uma essência há muito esquecida na linha de um tempo remoto. Para além do gesto de se assumir prática e criativamente, é aqui que passamos a entender que não devemos nada a ninguém. Adirley entendeu isso muito bem e exprimiu muito bem nesse seu primeiro longa.


Claro que a idéia da obra fronteiriça entre aquilo o que é documentário e o que é ficção se resguarda muito fortemente na bibliografia desenvolvida por nossos teóricos, críticos e realizadores que atentamente sentiram e observaram essas transições. Por isso, a priori, ele pareca tão abrupto.


Não há ambientação, introdução ou algo do tipo. O filme só começa. A nossa conexão com esses personagens vai se estabelecendo no fluxo com que a narrativa também vai sendo costurada. Nisso, o movimento é usualmente junto ao uso daquilo o que a perpectiva mais tradicional e iconoclasta carregam de mais forte, cada uma a seu modo.


Na perspectiva clássica, é o registro testemunhal, o uso da imagem e narração de arquivo que imperam. Na abordagem disruptiva, é a encenação e reconstituição do passado histórico e da realidade que ficam em primeiríssimo plano. Falar dos acordos aqui se torna essencial. Porque nesse estado definido, o filme se torna um laboratório de possibilidades.


Ou seja, se Dilmar Durães vai interpretar a si mesmo nessa espécie de reencenação de uma experiência fraturada na essência, ele pode optar por ser quem ele quiser. E assim é que surge Dildu, esse homem - síntese de um ideal brasileiro gestado naquele início de década e que teve como missão é legado, deixar marcada na nossa historiografia cinematográfica um perfil antológico.


Falamos desse cidadão brasileiro do futuro. Oprimido e esmagado por uma megaestrutura que hora se materializa, hora não, ele não se rende. Segue firme. Essa força é determinantemente sua maior fortaleza. Apesar de tudo isso, ele não é um herói idealizado, baluarte final de um movimento progressista emergente.


Adirley adverte muito claramente sobre isso a partir do modo como ele pensa, tanto Dildu quanto seus demais personagens de sua filmografia. Eles não estão isolados numa espécie de multiverso de um cinema de esquerda. Estão além disso. Superam isso porque se permitem e se inserem em um pensamento da representação da nacionalidade contemporânea para além dos idealismos.


Libertos do perigoso e opaco impulso reacionário, esse cinema encara as próprias máquinas de ideologização da pós modernidade brasileira para buscar, de alguma forma, refletir sobre possíveis propostas para nossa refundação enquanto sociedade. Se uma obra ancorada nesse sentimento não for aquela ideal e mais potente que temos em curso, eu não sei aonde estamos indo ou o que podermos mais fazer.


Assista à versão editada dessa obra-prima da nossa cinematografia abaixo.





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